Jornalismo Literário: características e lições de escrita do Novo Jornalismo

Confira as possibilidades do Jornalismo Literário e como usá-las para produzir textos surpreendentes e cheios de identidade!

Jornalismo Literário ou Novo Jornalismo

Jornalismo e literatura podem parecer uma combinação indigesta para algumas pessoas. Afinal, vai ser difícil encontrar alguém que queira ler “O dia amanheceu enevoado e com cheiro de morte…” logo no primeiro parágrafo de uma matéria sobre as condições meteorológicas dos próximos dias.

Entretanto, uma turma de Nova York e outras cidades estadunidenses provou que é possível, sim, fazer Jornalismo Literário e emplacar reportagens inesquecíveis. Para falar mais do Novo Jornalismo, seus representantes e seu legado, preparamos este post, em que abordamos:

Você sabia, inclusive, que o Jornalismo Literário pode inspirar quem trabalha com produção de conteúdo web? Então confira este post e saiba tudo sobre o assunto!

O que é Jornalismo Literário ou Novo Jornalismo?

Os dois termos descrevem um estilo de escrita jornalística que surgiu nos Estados Unidos na década de 1960. Ele manteve a sua força de 1970 em diante, influenciando autores em todo o mundo.

O nome “Novo Jornalismo” surgiu oficialmente em 1973, junto a um movimento que revolucionaria as redações do mundo todo. O objetivo? Quebrar os padrões impostos pelo fazer jornalístico pautado pela imparcialidade/objetividade. Nesse ano, Tom Wolfe cunhou o termo New Journalism em uma coletânea de ensaios que continha trabalhos de fôlego seus e de colegas ilustres, como:

  • Truman Capote;
  • Hunter S. Thompson;
  • Norman Mailer;
  • Janet Malcom;
  • Joan Didion;
  • Gay Talese;
  • Robert Christgau.

Você pode se perguntar: OK, mas… E quanto ao lado “literário” da coisa? Quando surgiu isso?

Ainda de acordo com Wolfe, esse novo tipo de jornalismo — que vinha como um manifesto às linhas editoriais cada vez mais mecanizadas pelo mito da objetividade jornalística —, tinha quatro técnicas que eram similares àquelas empregadas nos romances de ficção. São elas:

  1. construção cena por cena;
  2. registro completo do diálogo;
  3. ponto de vista em terceira pessoa;
  4. detalhes minuciosos para ressaltar a figura do protagonista.

Quais são as características do Jornalismo Literário?

O Jornalismo Literário era bastante aberto em relação aos caminhos a seguir. Até por isso é uma excelente inspiração para quem trabalha com produção de conteúdo para web, por exemplo, ou para qualquer profissional que pretenda escrever um blogpost com conteúdo relevante em algum momento. Contudo, seus autores compartilhavam algumas características em comum.

Humanização da história

A humanização introduzida pelo Jornalismo Literário ocorria de duas formas. A primeira era a capacidade de colocar pessoas comuns, sem qualquer ligação com o show business, no centro da história.

Gay Talese, por exemplo, gostava de dizer que ele era serendipitoso — a pessoa que descobre coisas inesperadas, que “tromba” nelas. Assim, um mero passeio pela sua cidade natal, Nova York, era uma oportunidade de descobrir pessoas fantásticas (e anônimas).

João do Rio, um jornalista brasileiro e nome de peso quando o assunto é Jornalismo Literário por aqui, também compartilhava da mesma ideia. Vale a pena conferir sua obra “A alma encantadora das ruas” para ter ideia da sua proposta do fazer jornalístico.

Já a outra humanização diz respeito à transformação de celebridades em pessoas de carne e osso, com problemas e dores iguais às de qualquer outro mortal. Um exemplo vem, novamente, de Talese: seu ensaio “Frank Sinatra está resfriado” foi todo baseado na recusa do lendário cantor em conceder uma entrevista ao jornalista.

Forte presença de storytelling

A arte de saber contar histórias. O storytelling é obrigatório em qualquer texto que tenha como influência o Jornalismo Literário. Pergunte à Truman Capote, que escreveu a obra-prima A Sangue Frio, tendo como base o assassinato de uma família no estado norte-americano do Kansas.

Outro dos exemplos mais bem-acabados é “A Canção do Carrasco”, de Norman Mailer, que contou a história do assassino Gary Gilmore. O criminoso se tornou especialmente famoso por exigir a pena de morte como castigo para as mortes que ele ocasionou.

Várias fontes para um assunto

Já vimos que Gay Talese escreveu um ensaio primoroso sobre Frank Sinatra sem nem mesmo entrevistá-lo. Mas isso não significa que as entrevistas não estivessem presentes na maioria dos outros trabalhos.

Uma das características mais marcantes do Jornalismo Literário é a extensão das reportagens, geralmente longas (algumas até viraram livros inteiros), que receberam o nome de “grandes-reportagens”.

Para isso, os jornalistas se baseavam em múltiplas entrevistas para criar algo bem-acabado, e costumavam levar dias, semanas ou até meses para finalizar o trabalho de coleta de informações.

Pense em Hunter S. Thompson, que entrevistou vários motociclistas para escrever o seu livro “Hell’s Angels” — e que passou um bom tempo, inclusive, viajando com eles. Profissionais como ele acreditavam em uma imersão completa, dando origem ao Jornalismo Gonzo — um braço um pouco mais radical do Novo Jornalismo.

Maior liberdade estilística

O texto podia ser mais romanesco ou em formato de ensaio. Poderia ser como uma conversa de bar, espontânea e leve, ou recorrendo ao virtuosismo literário.

Um dos grandes méritos da turma original do Jornalismo Literário eram suas influências — que variavam dos programas mais populares de televisão aos grandes clássicos literários, como Cervantes ou Shakespeare.

Por isso, nada mais natural que cada reportagem e cada livro fossem especiais, cada um à sua maneira. Não havia regras: a única norma era escrever com emoção e envolvimento.

Quais são as principais obras do Jornalismo Literário para se inspirar?

Todos os livros citados até aqui foram publicados no Brasil e ainda estão disponíveis, nem que você tenha que cavá-los em algum sebo. São eles:

  • “Radical Chique e o Novo Jornalismo”, de Tom Wolfe;
  • “A sangue Frio”, de Truman Capote;
  • “Hell’s Angels”, de Hunter S. Thompson;
  • “O jornalista e o assassino”, de Janet Malcom;
  • “A canção do carrasco”, de Norman Mailer;
  • “O álbum branco”, de Joan Didion;
  • “A milésima segunda noite da Avenida Paulista”, de Joel Silveira;
  • “Fama e Anonimato”, de Gay Talese.

Observações sobre essas obras

O brasileiro Joel Silveira não era, obviamente, da turma “oficial” de inauguração do Novo Jornalismo, uma vez que os escritores eram todos nascidos ou atuantes na imprensa dos EUA.

De qualquer modo, “A Milésima segunda noite da Avenida Paulista” é prova da influência do Novo Jornalismo em todo o mundo — inclusive no Brasil. Trata-se de uma coletânea de ensaios que abordam a vivência da “víbora” (apelido dado a Joel Silveira por Getúlio Vargas) no meio político e artístico do país, por exemplo.

O livro mais antigo dessa lista, e talvez o mais influente, é “A Sangue Frio”, de Truman Capote, lançado em 1966. O autor entrevistou centenas de pessoas e escreveu a história de dois assassinos de uma família inteira de forma cadenciada, honrando a construção “cena por cena” citada por Tom Wolfe.

O livro de Capote, inclusive, já foi acusado de conter informações imprecisas ou romantizadas demais. De qualquer modo, o autor partiu de um fato (o assassinato de uma família por dois homens) e elaborou uma história inesquecível com começo, meio e fim.

Outro detalhe é que o Jornalismo Literário não é limitado aos estadunidenses. O argentino Rodolfo Walsh, por exemplo, escreveu “Operação Massacre” em 1957. Há uma boa chance de que esse livro tenha influenciado o conceito de “romance de não ficção” cunhado por Capote.

Links na internet

Caso você queira conferir, na prática, alguns exemplos do Jornalismo Literário, veio ao lugar certo. Nossa primeira sugestão é uma reportagem do aclamado autor David Foster Wallace, um romancista que também escreveu grandes-reportagens.

Foster Wallace era tão genial, que transformou algo tão prosaico como o hábito de comer lagostas em um texto antológico. Seu ensaio foi traduzido e publicado na revista piauí.

Também separamos dois textos de três representantes da turma original do Novo Jornalismo: Norman Mailer, Hunter Thompson e Tom Wolfe.

Como o Jornalismo Literário pode trazer aprendizados importantes para sua carreira?

O Jornalismo Literário mostrou que qualquer pessoa é um conteúdo em potencial. Um exemplo: a reportagem “O Segredo de Joe Gould”, de Joseph Mitchell, contou a história de um homem que vivia como um mendigo em Nova York.

Contudo, Joe Gould não era uma figura exatamente comum. Entre as suas andanças nas ruas da cidade mais famosa do mundo, ele compunha a sua “História Oral do nosso tempo”. Quando Mitchell o entrevistou, sua obra já era “11 vezes maior que a Bíblia”.

Do mesmo modo que a pessoa perfilada não precisa ser uma celebridade inacessível, o próprio jornalista não precisa ter acesso aos círculos mais restritos para produzir uma boa história. Suas fontes estão em qualquer lugar — na rua, na padaria, na fila do cinema, dentro de um táxi.

Nesse sentido, uma lição importante deixada pelo Jornalismo Literário é que todo mundo já tem todos os atributos necessários para produzir uma boa história. Em seu “Fama e Anonimato”, Gay Talese escreveu que “Nova Iorque é uma cidade de coisas que passam despercebidas”.

Ele mencionava a cidade, porque era a sua base de operações, e não porque fosse um dos destinos mais badalados do mundo. Nesse contexto, qualquer endereço é um lugar com coisas que passam despercebidas: cabe ao bom escritor desvelar o que jaz escondido.

Como escrever melhor com o Jornalismo Literário?

O Jornalismo Literário é uma tremenda inspiração para quem quer se especializar no storytelling, por exemplo. Os autores citados aqui têm uma produção bastante diversificada: é possível encontrar ensaios mais curtos e livros de mais de 400 páginas.

Assim, é possível enriquecer a própria escrita ao estudar a obra desses mestres e mestras do grande jornalismo e do Jornalismo Literário. Para aqueles que querem fugir do formato mais engessado do jornalismo tradicional (com os seus leads, pirâmides invertidas e objetividade), não há uma fonte melhor para se inspirar.

Para complementar a sua leitura e aprender outras dicas relacionadas à boa escrita, confira os seguintes conteúdos:

Agora que conheceu um pouco sobre o Jornalismo Literário, pode mergulhar sem medo nos livros e autores indicados aqui. Além de ler reportagens assinadas por algumas das pessoas mais talentosas que já frequentaram uma redação, você ainda aprenderá muito com seu estilo e repertório.

Curtiu o artigo e quer aprender mais sobre a arte de contar histórias? Então, não deixe de conferir o nosso webinar sobre storytelling!

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William Alves e Walquíria Domingues

Briefing

Luciana Ribeiro Rodrigues

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