Este conteúdo vai falar sobre gamificação, octalysis framework, processos de marketing mas, principalmente, de Tibia!
Se você não viveu os gloriosos anos 2000 enfiado em uma lan house como eu, provavelmente não faz ideia do que é Tibia.
Mas não tem problema. Tudo que você precisa saber é que Tibia é um jogo coletivo de representação online que tem gráficos muito ruins (sejamos honestos) e foi muito popular entre os jovens brasileiros, indianos e colombianos naquela época.
Não estou contando que jogo Tibia há 10 anos para jogar conversa fora (embora isso renda ótimas conversas em mesas de bar), mas para te contextualizar.
Veja bem, como tibiana de coração, sempre me interessei pela capacidade de um jogo — e aqui falo não só do Tibia, mas qualquer jogo popular — de prender a atenção das pessoas e até viciá-las em repetições bobas, como atingir o mesmo monstro infinitas vezes para ganhar um pontinho.
Afinal, por qual motivo uma pessoa a não consegue ler um texto de duas páginas sem interrupções, mas pode passar horas a fio numa tela de celular desviando um passarinho feio de canos (sim, eu estou falando de você Flappy Bird)?
Você poderia dizer que, com tanta informação disponível na internet, está cada vez mais difícil prender a atenção das pessoas, o que é uma verdade. Ou pode responder apenas que jogos são mais legais que a leitura, o que depende do ponto de vista.
Mas, estudando o assunto, descobri que existem fatores muito elaborados que fazem um jogo conseguir altos níveis de engajamento de seus usuários.
E o melhor: que você também pode aplicar esses fatores na sua estratégia de Marketing e aumentar o engajamento com a sua audiência!
Então, nesse artigo, vou compartilhar com você um framework que têm me ajudado a pensar minhas estratégias aqui na Rock para aumentar as nossas taxas de conversão.
Mas, assim como em todos os jogos, preciso que você “mate” alguns conceitos pequenos antes de chegar ao chefão. Vamos lá?
O que é gamificação e por que ela funciona
A primeira fase desse conteúdo é uma fase de conceitualização, então vamos começar pelo conceito de gamificação:
Gamificação é a aplicação de princípios, lógicas e conceitos de jogos em outros contextos para melhorar a experiência das pessoas e, por consequência, aumentar o seu engajamento.
Ou seja, é o ato de pegar os mecanismos de jogos que os tornam tão cativantes e aplicar em situações do cotidiano, como um fluxo de nutrição ou landing pages.
Existem vários motivos que levam uma pessoa a um jogo. Alguns que me levaram ao Tibia, por exemplo, são:
- Char personalizado: eu consigo criar um personagem nos moldes e com as características que desejo;
- Gráfico de evolução: são claras as habilidades que preciso desenvolver e quais eu já domino;
- Pensamento estratégico: posso criar planos para subir de nível mais rápido, escapar de monstros fortes e até tramar vinganças contra outros jogadores;
- +1000 níveis: não existe limite de evolução e o título de jogador mais forte está sempre “ao alcance”;
- Itens colecionáveis: o Tibia oferece recompensas em datas especiais que podem ser vendidas por valores altos ou mesmo guardadas como um troféu;
- Bate-papo universal: é possível conhecer pessoas de todo o mundo no jogo;
- Comunidade engajada: existem vários grupos de jogadores que mantém contato diário, conversam sobre as atualizações e se ajudam;
- E, é claro, magias legais: há uma variedade de encantamentos que são liberados de acordo com o seu nível.
Alguns desses aspectos já são utilizados pelas empresas, como o char personalizado. Um exemplo é o perfil do Facebook.
Em breve eu vou te dar outros exemplos e ensinar como identificar quais mecanismos de jogo podem ser interessantes para o Marketing da sua empresa.
Mas antes, você precisa compreender melhor a figura do jogador. Afinal, todo o ponto da gamificação é tornar a experiência do usuário prazerosa. E, para isso, você precisa conhecer a jornada desse usuário e suas necessidades.
A jornada do jogador e os quatro perfis de players
Todos os jogos possuem quatro etapas pelas quais os jogadores passam: discovery, onboarding, scaffolding e endgame. Juntas, elas compõem a jornada do jogador.
- Discovery: a conversão. É quando a pessoa descobre a existência de um jogo e, pela forma com que ele se apresenta, decide se cadastrar para jogá-lo ou não. No Tibia, isso é a página de download do jogo. Em termos de marketing, seria a nossa Landing Page.
- Onboarding: o aprendizado. Quando o usuário acaba de entrar no jogo e precisa compreender seus comandos logo, para realizar as primeiras ações rapidamente. Geralmente é feito por bots que orientam o jogador toda vez que ele se depara com uma nova funcionalidade, como os NPCs (jogadores robôs) do Tibia. Algumas plataformas também utilizam esse recurso, como a RD Station.
- Scaffolding: a construção do hábito. Quando o usuário compreende a necessidade de realizar ações repetitivas para ganhar pontos e cria uma rotina dentro jogo. No Tibia, por exemplo, é preciso fazer várias missões aos mesmos lugares antes de conseguir subir de nível e acessar outros lugares do mapa. O LinkedIn é outra plataforma que incentiva o hábito de postar aumentando o alcance de quem realiza essa ação com frequência.
- Endgame: a recompensa. Quando o usuário cumpre um propósito do jogo e precisa ser reconhecido para continuar jogando. Ao matar um chefão no Tibia depois de passar por vários de seus seguidores, você espera receber itens valiosos e muitos pontos. O Nubank, após “matar” os pagamentos de vários meses em dia, aumenta o seu crédito para que você continue usando o cartão.
Entender o que acontece em cada uma dessas fases é fundamental para saber como engajar o usuário e fazê-lo andar no “funil” do jogo.
Mas, para isso, você precisa saber também qual o perfil do jogador — a sua persona —, certo?
Assim como são quatro etapas do jogo, também existem quatro perfis de jogadores: achievers, explorers, socializers e killers.
- Achievers, os desbravadores. São os jogadores mais fissurados, pois querem descobrir absolutamente tudo. O que os move é a sua vontade de dominar aquele jogo, decifrar suas regras e se tornar uma referência nele;
- Explorers, os impacientes. Assim como os achievers, esses players tem muita sede de desbravar o jogo. Mas, como são movidos apenas pela curiosidade, perdem o interesse rapidamente se as instruções não são claras ou se o jogo exige muito esforço;
- Socializers, os carentes. Como o nome diz, os socializers odeiam jogar sozinhos. Por isso, precisam de funcionalidades que incentivem a socialização, como chats para conversar com os amigos ou missões de grupos dentro do game;
- Killers, os experimentadores. Esses jogadores não têm muita paciência para se dedicar a um jogo, por isso geralmente passam pelo onboarding e desistem.
Como têm motivações diversas, esses quatro jogadores respondem de maneiras diferentes a cada uma das etapas do jogo e precisam de atenções especiais. Por exemplo, um jogo com onboarding extremamente complexo pode ser o paraíso para um achiever e um inferno para um explorer.
Por isso, um jogo tem etapas planejadas de acordo com o perfil de seu jogador ideal — da mesma forma que, em Marketing de Conteúdo, produzimos conteúdo adequado para a nossa persona em cada etapa do funil de vendas.
Mas como saber exatamente que funcionalidades melhorar para entregar uma jornada interessante para o seu player? Bom, é agora que entramos no octalysis framework!
O octalysis framework e os oito gatilhos do comportamento humano
O octalysis é um framework criado pelo guru Yu-kai Chou que prega o uso de human focused design (design focado em pessoas) para criar projetos gamificados.
O framework foi batizado assim porque sua estrutura é a de um octágono. Cada lado da figura se baseia em um dos oito gatilhos-chave do comportamento humano — estímulos que levam as pessoas ao engajamento.
São eles:
- Chamado épico (Meaning)
- Desenvolvimento e realização (Accomplishment)
- Empoderamento (Empowerment)
- Propriedade e posse (Ownership)
- Influência social e afinidade (Social Influence)
- Escassez e impaciência (Scarcity)
- Imprevisibilidade e curiosidade (Unpredictability)
- Perda e evasão (Avoidance)
Como é de extrema importância que você os compreenda para usar o octalysis framework, vou detalhar um por um agora usando alguns exemplos, ok?
Chamado épico
O chamado épico é o gatilho que remete ao sentido da vida e da humanidade. Você convida a pessoa a fazer parte de algo maior do que ela.
Em jogos, geralmente esse chamado épico é exercitado pelo fazer parte de uma comunidade de jogadores responsáveis por manter o game vivo. Por exemplo, o chamado épico do Tibia é fazer parte dos fóruns e escrever no Tibia Wiki, a enciclopédia colaborativa do jogo.
Um exemplo de empresas que utiliza muito bem o chamado épico é o Waze.
A aplicativo convida você a participar de um grupo de motoristas que se sobrepõe aos órgãos públicos para construir um trânsito melhor. Você não está apenas informando um buraco na estrada, você está contribuindo com o bem maior da comunidade.
Desenvolvimento e realização
O estímulo do desenvolvimento e da realização é aquele que faz você sentir que está evoluindo em algum aspecto da sua vida. Esse crescimento pode ser pessoal, profissional, financeiro etc.; mas precisa trazer um impacto positivo na sua vida.
Não é a toa que a maioria dos jogos conta com uma barra de progresso. A ideia é justamente que você consiga ver seu desenvolvimento em tempo real e se sinta impelido a deixar a barra completa, alcançando seu potencial máximo.
Um exemplo são as barras do Tibia, que mostram várias skills do seu personagem e como você está desenvolvendo cada uma delas:
Uma empresa que utiliza isso de forma muito inteligente é o LinkedIn, que faz você subir de nível cada vez que insere informações no seu perfil e ainda tem um score de engajamento chamado Social Selling Index (SSI).
O SSI do LinkedIn te dá uma pontuação baseada no número de interações com seus contatos e informa o seu progresso semanal para se tornar um influencer. Quanto mais alto seu SSI, mais impacto você está causando na sua rede.
Empoderamento
O empoderamento é o estímulo que te dá a possibilidade de crescer criando planos e aprendendo com seus próprios erros, por meio da experimentação. Você sente está evoluindo por conta própria, sem precisar da ajuda do jogo.
Este gif do Tibia ilustra de uma forma bem boba, mas é basicamente isso:
Você encontra um buraco, não sabe o que tem, entra pela curiosidade, encontra um bicho forte e morre. O que você aprendeu? A não entrar mais naquele buraco ou se armar para voltar lá (de preferência quando estiver em um level maior).
Mas o melhor exemplo para empoderamento é um joguinho de lógica sensacional chamado That Level Again!
A premissa dele é que você está na ponta de uma sala e precisa atravessar uma porta que fica no lado oposto, mas a porta só abre se você apertar um botão que fica exatamente no meio do caminho.
Como o nome diz, o propósito do That Level Again é passar pelo mesmo nível várias vezes. Por isso, a cada fase o botão deve ser apertado de uma forma diferente, que você precisa descobrir qual é com apenas uma dica.
Assim, você vai testando hipóteses, aprendendo com o jogo e desenvolvendo seu raciocínio para passar de fase. E quando você consegue desvendar sozinho uma dica, é impossível não se sentir mais inteligente e criativo!
Segue um vídeo que pode ajudar você compreender melhor (contém spoilers do jogo, então recomendo ver apenas as três primeiras soluções, no máximo).
Propriedade e posse
A motivação por trás do gatilho de propriedade e posse é fazer você se sentir dono de uma coisa e, por isso, responsável por cuidá-la e torná-la o melhor possível.
No caso do Tibia, é possível comprar casas no jogo e acumular todos os itens que você ganha nas suas caçadas. É pela quantidade de itens, inclusive, que sabemos que estamos passando pela casa de alguém muito rico no jogo, então todo mundo quer ter muitos itens valiosos.
Uma empresa que é case de sucesso desse gatilho é a Coca-Cola, que já lançou várias coleções como os gelocósmicos, ursos polares e os famosos minicraques, os bonecos cabeçudos da Copa de 98.
Influência social e afinidade
O gatilho da influência social e afinidade se refere ao impacto que você pode causar em outras pessoas e do trabalho em equipe.
A motivação por trás dela é que você vai ficar por dentro de tendências, receber o apoio de um grupo e encontrar pessoas com gostos comuns aos seus.
O Tibia investe em Influência Social por meio de várias world quests, missões que precisam da ajuda de centenas de jogadores para serem cumpridas e que premia o mundo todo caso o grupo consiga.
A “piece of cake” é a minha preferida! Essa world quest coloca os jogadores para lutarem contra bolos monstruosos e usarem seus corpos para construir uma ponte para a ilha do bolo, onde existe um bolo gigante que deve ser devorado.
A partir do início da piece of cake quest, os jogadores têm um prazo de cinco dias para devorar o bolo. Se conseguirem, o mundo onde jogam recebe sete dias de bônus em experiência (50%), vida e mana (25%).
A MaxMilhas é um caso muito legal de empresa que utiliza essa mesma tática com o Dia Mundial das Milhas, quando milhares de pessoas se unem para conseguirem descontos para viajar.
A ideia é que quanto mais gente se inscrever no site, maior o desconto recebido por todos. Ou seja, é necessário um verdadeiro trabalho de equipe para angariar novos inscritos e aumentar o prêmio.
Um outro exemplo do gatilho da influência é o programa de reviews da Amazon, que permite a qualquer comprador dar sua opinião sobre um produto, ajudar a comunidade e ser reconhecido por ela.
Escassez e impaciência
O gatilho da escassez e da impaciência partem do pressuposto que as pessoas desejam muito coisas que são exclusivas e únicas. É por isso que ele te motiva com a sensação de que algo é limitado, mas você pode conseguir agora.
No Tibia, a quantidade de monstros são limitados e, em alguns lugares, apenas um jogador é suficiente para matar todos. Portanto, o jogador que chegar primeiro no local ganha o prêmio.
Assim, o gatilho faz com que você queira entrar no jogo o mais cedo possível e ficar com o local de caça só para você.
O Candy Crush é um caso de jogo que usa a escassez para monetizar. O jogo é gratuito, mas você tem uma quantidade de vidas limitadas. Quando acaba com todas, ele te dá a oportunidade de conseguir outras imediatamente — se pagar por elas.
Outro caso são empresas de telefonia, como neste exemplo da Tim, que limitam o acesso à internet e, quando atingido o limite, oferecem uma extensão mediante pagamento.
Imprevisibilidade e curiosidade
Esse é fácil de adivinhar, né? O gatilho da imprevisibilidade e da curiosidade diz que você sempre pode se surpreender com algo, mesmo que já conheça o assunto a fundo.
A sensação é a de estar brincando em uma máquina caça-níqueis: você sabe como funciona e que suas chances são mínimas, mas quem sabe sua sorte muda?
Por conta do server save diário, os mundos do Tibia são reiniciados regularmente. Isso significa que uma caverna aberta antes do server save aparecerá fechada logo após, já que as modificações realizadas por jogadores são desfeitas.
Prova disso é uma área chamada Sunken Mines. Ela fica inundada a maior parte do tempo até que um jogador chegue com uma boa (e cara) quantia de carvão e drene toda água, abrindo uma passagem secreta para uma caverna cheia de monstros.
Todos os dias após o server save, a área reaparece inundada e é preciso uma nova drenagem. Como os jogadores pobres não conseguem pagar a drenagem, precisam tentar a sorte diariamente, indo até Sunken Mines checar se ela foi drenada por outro jogador.
O mesmo acontece no Pokémon Go. Você pode se surpreender encontrando grandes áreas onde pokémons estão sendo lurados ou encontrar pokémons raros pelo caminho apenas por sorte — mas precisa andar muito e checar vários lugares para testar a sorte.
O feed do Facebook é outro exemplo desse jogo de sorte.
Todos já conhecemos seu funcionamento e sabemos o que esperar, mas ainda alimentamos aquela esperança de encontrar um post que vai mudar a nossa vida (e que nos faz entrar na rede social todos os dias).
Perda e evasão
O gatilho da perda e evasão é relacionado à precaução. A motivação aqui é que você vai deixar passar a oportunidade da sua vida se não tomar uma atitude. E ninguém gosta de perder, certo?
O Tibia oferece algumas recompensas de duração limitada, como sete dias de conta premium grátis. E quando você ganha essa recompensa acaba logando no jogo todos os dias, mesmo que não esteja muito disposto a caçar, apenas para não desperdiçar os minutos restantes da conta premium, que ficam em um mostrador.
O mesmo acontece em Super Mario Bros. Toda vez que passamos por um tijolo sinalizado com um ponto de interrogação a reação é a mesma: pulamos para bater a cabeça no tijolo e verificar se tem algum prêmio.
Pode ser que não tenha nenhum, mas precisamos verificar todos para não perder as oportunidades.
Um exemplo de empresa que faz isso bem é o Booking, que mostra as hospedagens com maior procura. Assim o usuário é estimulado a fazer sua reserva o mais rápido possível para não perder a vaga.
Como preencher o octalysis framework
Conhecendo os oito gatilhos do comportamento humano você já pode preencher o octalysis framework com as características do seu negócio e compreender melhor o engajamento dos seus usuários.
Pense em exemplos de como cada um dos gatilhos é utilizado pela sua empresa e, com base nesse levantamento, avalie de 0 a 10 o seu aproveitamento. Você pode fazer isso nesse link.
Se sua empresa tem vários canais que incentivam a comunicação e o trabalho em equipe, por exemplo, significa que mandam muito bem em influência social e podem colocar nota 10 naquilo. Agora se vocês não fornecem nenhum tipo de interação entre os usuários além de um email, a nota pode ser 2.
Cada caso é um caso, mas o importante é que você avalie criticamente em quais pontos sua empresa referência e em quais está deixando a desejar
O Waze, por exemplo, é bastante forte no chamado épico e realização, mas deixa muito a desejar nos quesitos escassez e empoderamento. Assim, o time do Waze sabe que pode apostar nesses gatilhos para aumentar o volume de pessoas ativas no aplicativo.
White hats e black hats de engajamento
Lendo sobre os oito gatilhos da motivação você deve ter percebido que, na prática, alguns não são tão legais, certo?
Afinal, mesmo que o gatilho de imprevisibilidade faça você entrar no Facebook sempre, ninguém gosta de ficar rolando o feed todos os dias para ver se algo legal aparece. Ou, se gosta, dificilmente sente que está evoluindo com isso.
Na verdade, quando rola o feed eternamente sem ter algum lucro com isso mas não consegue desapegar, você se sente meio enganado. É por isso que imprevisibilidade é considerado black hat.
As motivações black hat manipulam os usuários para realizarem algumas ações, como uma compra ou apertar um botão. São considerados gatilhos black hats (portanto manipuladores):
- Influência social e afinidade
- Escassez e impaciência
- Imprevisibilidade e curiosidade
- Perda e evasão
Por outro lado, existem os gatilhos white hats, que colocam o poder decisivo completamente nas mãos do usuário e os fazem se sentir bem quando realizam alguma ação. São eles:
- Chamado épico
- Desenvolvimento e realização
- Empoderamento
- Propriedade e posse
Assim, o octalysis framework pode ser dividido da seguinte forma:
O Facebook, por exemplo, aposta em funcionalidades manipuladoras que viciam seus usuários.
Mas essas mesmas funcionalidades incentivam coisas negativas como a dependência dos amigos para encontrar valor na rede social, a falsa imagem de que a vida de todos os usuários são perfeitas, o medo de se sentir excluído caso não verifique o seu perfil, entre outras.
Analisando o framework do Facebook, podemos ver claramente que o lado referente aos black hats é muito maior, enquanto o de white hats deixa super a desejar. Ou seja, você usa muito o Facebook, mas a experiência em geral não é agradável.
É por isso que devemos ter cuidado ao escolher em quais gatilhos vale a pena investir e quais é melhor deixar em baixa, para não forçar a barra com nossos “jogadores”.
Na dúvida, ao criar um projeto gamificado, tenha em mente que:
- Tudo white hat: é agradável, mas não viraliza;
- Tudo black hat: viraliza, mas não retém o usuário.
O aconselhável é utilizar apenas um black hat na sua estratégia, preferencialmente para o evento mais importante da jornada, como a venda ou o cadastro.
Engajamento pela lógica e pela emoção
Além da divisão em white e black hats, também podemos classificar os gatilhos do octalysis framework em lógicos e emocionais.
O lado esquerdo diz respeito das motivações extrínsecas, para chegar a um resultado específico. Você é induzido à ação pela lógica, porque as razões são favoráveis para isso ou porque será recompensado no final.
São gatilhos que motivam decisões baseadas em dados e fatos:
- Desenvolvimento e realização
- Escassez e impaciência
- Propriedade e posse
- Perda e evasão
Já o lado direito vem de motivações intrínsecas e se refere às decisões emocionais, baseadas na experiência que você tem ou pode ter. Você age porque se sente bem ou energizado ao fazê-lo. São eles:
- Chamado épico
- Influência social e afinidade
- Empoderamento
- Imprevisibilidade e curiosidade
Sendo referente à lógica, os gatilhos do lado esquerdo oferecem experiências que você não gosta, mas realiza porque são sensatas. Já o direito são as experiências agradáveis, que não precisam de prêmios no final porque são prazerosas por si só.
A análise de Game of Thrones mostra exatamente isso: a série aposta em funcionalidades emocionais que nos fazem sentir por dentro das últimas novidades da cultura pop, parte de uma comunidade engajada de fãs, conhecedor de estratégias de guerra e tramas políticas, além de ansiosos pelos próximos acontecimentos.
Como é praticamente toda voltada para motivações emocionais, você gosta da série porque ela te entretém. Mas, ocasionalmente, pode sentir que o tempo que passa na frente da TV poderia estar sendo usado para algo mais útil.
Vale apontar que o extrínseco tende a matar o intrínseco na maioria dos casos, já que tornar uma coisa “sensata” é uma excelente maneira de tirar a parte divertida dela.
Por exemplo, eu gosto de jogar Tibia porque me sinto bem com a experiência, e não porque ele traz algo produtivo para a minha vida. Isso é o que me mantém engajada a longo prazo.
Agora, se alguém quiser estragar o Tibia, basta tornar o jogo uma obrigação do tipo “você tem que jogar uma hora todos os dias”. Mesmo que eu seja paga por isso, vou achar uma experiência horrível ter que jogar.
Por essa razão, contrabalance seu projeto!
O segredo de um bom projeto gamificado é o balanço entre gatilhos lógicos e emocionais, mas lembre-se que a experiência do usuário é, no fim das contas, mais importante do que os resultados que você promete para ele.
Octalysis framework na prática: analisando o Instagram
Agora que você já passou pela fase de conceituação desse conteúdo é hora de um pouco de análise! Vamos lá?
Imagine que você trabalha em uma empresa SaaS como o Instagram e precisa aumentar seu número de usuários ativos. Quais pontos você trabalharia para atingir sua meta?
Analisando o caminho padrão de um usuário do Instagram, podemos concluir que esse caminho passa por quatro etapas ou sub-objetivos:
- Convencer mais pessoas a se cadastrarem no seu aplicativo;
- Conseguir que essas pessoas interajam com outros perfis, pois isso marca a passagem de um cadastrado para usuário;
- Fazer com que os novos usuários retornem ao aplicativo realizando ações como postar, curtir ou comentar, o que mostraria que estão engajados;
- Fazer com que mais pessoas atinjam o número de acessos necessário para serem marcados como usuários ativos.
Se você observar atentamente, vai perceber que essas etapas se tratam da jornada do jogador:
- Convencer mais pessoas a se cadastrarem no seu aplicativo = Discovery, a conversão;
- Conseguir que essas pessoas interajam com outros perfis, pois isso é exigido um cadastro do usuário e ele é apresentado aos primeiros passos = Onboarding, os primeiros passos;
- Fazer com que os novos usuários retornem ao aplicativo realizando ações como postar, curtir ou comentar, o que mlostraria que estão engajados = Scaffolding, a construção do hábito;
- Fazer com que mais pessoas atinjam o número de acessos necessário para serem marcados como usuários ativos = End game, a recompensa ao final de um ciclo.
Aqui vale lembrar que, ao trabalhar com gamificação, estamos lidando com jogadores diferentes. Afinal, um achiever vai compreender o Instagram de uma forma muito diferente de um socializer.
O objetivo de um achiever no Instagram é dominar aquela rede social e descobrir tudo sobre ela. Então a navegação deve favorecer a descoberta de novas funcionalidades como Stories, hashtags e filtros.
Já um socializer deve construir sua rede o mais rápido possível para ver valor no app. Do contrário, ele não conseguirá a interação social que lhe é tão necessária para gostar de algo.
Como então criar um projeto gamificado para todos os tipos de usuários do Instagram levando em conta as etapas que precisamos seguir?
Bom, agora você chegou à gamificação na prática!
Para usar o octalysis framework na criação de um projeto gamificado, precisamos pensar toda a jornada para o seu tipo de jogador. Algo assim:
Como não é tão fácil chegar à esse gráfico logo de cara, aqui vai um passo a passo simples para você seguir:
- Descubra qual perfil de jogador é a sua persona;
- Estabeleça os gatilhos mais funcionais para ela em cada etapa da jornada;
- Certifique-se de manter o equilíbrio entre black e white hats, motivações lógicas e emocionais.
Vamos supor que o perfil de usuário do Instagram é o socializer (um chute mesmo).
Como já expliquei, esse tipo de usuário odeia “jogar” sozinho e precisa de funcionalidades que incentivem a socialização. Portanto, alguns gatilhos que funcionam bem para ele são:
- Chamado épico: ele vai fazer parte de uma comunidade;
- Influência social: ele poderá ditar e descobrir tendências;
- Desenvolvimento e realização: ele pode melhorar sua imagem pública;
- Imprevisibilidade: ele fica curioso sobre o que sua rede está fazendo;
- Perda e evasão: ele não quer ser o único que não usa o app.
Influência social, imprevisibilidade e perda e evasão são black hats, então devem ser usados com parcimônia.
Agora, vamos analisar as etapas! A página do Instagram responsável pelo Discovery, e portanto pela conversão, é essa:
Por essa página, podemos criar um perfil no octalysis framework para o Discovery que o socializer tem no Instagram.
Como você pode ver, o Discovery do Instagram é quase todo baseado em gatilhos emocionais, além de usar três black hats na mesma página. Isso significa que você sente que precisa completar o cadastro para não ficar excluído, mas que o cadastro não é uma experiência legal.
O problema de usar tantos black hats logo de cara é que, se a pessoa entrar no aplicativo e não conseguir cumprir seu objetivo de socializar logo, se sentirá enganada e desistirá do app.
Mas, assim como a maioria dos casos de Discovery, o equilíbrio do Instagram pode ser estabelecido com um simples caso de mudança de copy.
Para conseguir atingir o sub-objetivo de convencer mais pessoas a se cadastrarem no aplicativo, uma alternativa seria amenizar o copy diminuindo o peso dos black hats e focando nos benefícios de ter seu próprio perfil no Instagram (Propriedade e posse) e de fazer parte de uma Comunidade de milhões de usuários que compartilham a vida em imagens (Chamado épico).
Agora vamos dar uma olhada no onboarding!
Logo depois do cadastro, o Instagram nos apresenta uma tela com a possibilidade de conectar ao Facebook e encontrar seus amigos ou seguir vários famosos.
Embora não pareça uma página muito rica, analisando-o no octalysis framework podemos perceber o uso de vários gatilhos:
Repare que o gráfico do Onboarding está mais equilibrado do que o de Discovery, usando medidas semelhantes de motivações lógicas e emocionais e black e white hats.
Isso torna a experiência de onboarding razoavelmente agradável e bastante enriquecedora para quem está aprendendo.
Além disso, você lembra que o aconselhável é usar um único black hat na ação mais importante do usuário?
O objetivo principal do Onboarding é fazer com que o socializer consiga sua primeira interação o mais rápido possível e assim se torne um usuário de fato. E essa conversão de um cadastrado para usuário é, possivelmente, a ação mais importante do Instagram.
Por isso, faz sentido que ali esteja o maior black hat do Instagram!
Para aumentar o número de primeiras interações, o Instagram poderia diminuir o apelo de influência social e apostar mais em imprevisibilidade, atiçando a curiosidade do novo usuário com alguns dos posts mais curtidos da rede, por exemplo.
Olhemos agora para o Scaffolding!
Para incentivar no usuário o hábito de entrar no aplicativo, o Instagram encoraja a utilizar recursos como os novos filtros do stories, postar vídeos e usar hashtags para ser encontrado por mais pessoas. Além, é claro, do feed “caça-níqueis”, similar ao do Facebook.
O app também costuma enviar algumas notificações push como “fulano acabou de postar uma foto”, “fulano está ao vivo”, “você não posta há algum tempo”.
Essas notificações são recursos muito simples e que trabalham com gatilhos black hats, como fica claro no octalysis framework do Scaffolding:
Isso é muito ruim porque, a não ser que a postagem da notificação seja realmente imperdível (e quase nunca é), ela não fornece ao usuário nenhum benefício de fato. Pelo contrário, ele se sente incomodado com as notificações e tende a desligá-las e esquecer do app.
Porém, por conta das outras motivações lógicas, o usuário é impelido a investir seu tempo em postar mais e construir uma rede de contatos no Instagram.
O feed caça-níqueis também mantém o usuário viciado em logar apenas pela possibilidade de ser “premiado” com um post legal. Funciona a curto prazo, mas a longo prazo ele sente que perde muito tempo no Instagram (e aqui eu aposto alguns likes que o Instagram tem um churn alto depois de um ano).
Uma maneira de atingir o objetivo número 3 e fazer com que os novos usuários retornem ao aplicativo realizando ações como postar, curtir e comentar é apostando mais no valor da Comunidade.
Como o jogador socializer gosta de fazer parte de um grupo, uma boa aposta é aumentar o valor em fazer parte daquele grupo de usuários mostrando o impacto deles no mundo, como a Coca-Cola faz em suas campanhas “abra a felicidade”, por exemplo (chamado épico).
O empoderamento também poderia ser mais explorado em prol da imprevisibilidade, permitindo que os usuários usassem mais da criatividade e menos templates na hora de criar conteúdo.
E agora vamos ver o End game, a etapa final depois que você já se habituou ao Instagram.
Alguns exemplos de recursos do app para essa fase são os marcos de seguidores ou a verificação de conta, liberada apenas para usuários realmente relevantes.
Nessa etapa, o desenvolvimento é o gatilho mais forte!
Você quer completar 200 postagens, conseguir 500 likes em uma foto, alcançar 1000 seguidores logo… É como se esses números fossem a sua barra de progresso e medissem o seu sucesso pessoal.
Ao mesmo tempo, você é estimulado pelo gatilho da propriedade e posse para cuidar bem do seu perfil, e pelo gatilho do empoderamento para realizar testes e conseguir mais likes.
Não sabemos se o Instagram tem marcos de curtidas ou postagens para seus usuários, mas uma forma interessante de aumentar o número de usuários ativos seria estabelecer milestones para ser um influencer.
Assim, ele poderia parabenizar os usuários que as alcançarem. Por exemplo, liberar um filtro novo quando você fizer 100 postagens ou um selo para quem alcança mil seguidores.
Mas essas são apenas ideias para tornar o Instagram mais gamificado.
Na verdade, tudo é teste! Tenha um objetivo em mente, crie uma hipótese e valide.
No caso de querer aumentar a taxa de cadastrados no Discovery, por exemplo, você pode fazer um teste A/B de copy. O texto atual seria a versão A e o texto que usa o gatilho de chamado épico a versão B.
Determine a amostragem de visitantes que você precisa para alcançar um alto nível de confiabilidade de resultados — existem várias calculadoras online que podem te ajudar com isso — e, após alcançar o número de visitantes esperado na página, analise.
A versão que mais converte é a versão campeã. Mas continue testando e colete feedbacks dos usuários para deixar a experiência ainda melhor!
O Instagram mesmo fez vários testes em sua versão beta antes de disponibilizar o Stories para todos — e ainda tem trocentos testes rolando nesse exato momento.
Usos do octalysis framework em marketing
Agora que você já sabe o processo para criar um projeto gamificado, podemos pensar em outros usos para o octalysis framework na sua estratégia de marketing.
Aqui na Rock, por exemplo, já utilizamos para:
- Aumentar a taxa de conversão das landing pages;
- Acelerar o processo de onboarding na nossa plataforma;
- Analisar o uso diário da plataforma na perspectiva do freelancer;
- E até para pensar a inclusão de novos rockers na empresa!
Mas você consegue pensar em vários outros casos, certo?
Faça sua experiência e compartilhe com a gente nos comentários! Se você ficou com alguma dúvida ou quer ler um caso de estudo aqui da Rock, deixe abaixo também.
Até a próxima e let’s play!
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