Quando traduzir, localizar ou transcriar?

O processo de globalização de negócios está eliminando aos poucos as barreiras físicas de quem empreende. No entanto, antes de produzir conteúdos para públicos estrangeiros, é necessário entender qual é a melhor opção para a sua estratégia.

Tradução vs localizaçâo vs transcriação

Os profissionais de línguas e marketing internacional com os quais trabalhamos sempre enfrentam a mesma situação: tenho um cliente que quer expandir seus negócios e já tem muito conteúdo com bom desempenho. É possível traduzir os materiais deles?

Antes de responder, respiramos e recorremos a São Jerônimo, porque, depois dessa pergunta, vem uma longa explicação:

“Depende do que você quer, o tipo de material que você pretende traduzir para uma língua estrangeira, os dados que ele apresenta e o resultado que você precisa”. 

Eu sei que não é a resposta que você esperava, mas a tradução é uma das atividades mais complexas e exigentes dentro da área de Letras — portanto, um sim ou um não são insuficientes. Ao incluirmos as complexidades do marketing digital dentro da equação, pode-se entender que essa atividade não se resume simplesmente a traduzir. Afinal, o marketing é internacional, e essa é a cereja do bolo.

É muito mais do que você imaginava, certo? Neste artigo, eu vou contar como você deve trabalhar esses conteúdos, a partir do primeiro contato com seu cliente até a execução. Um spoiler: the devil is in the details. Vamos lá?

Como orientar seu cliente na internacionalização da estratégia?

Acredito que uma das coisas mais fascinantes de trabalhar com línguas em um nível profissional e mais técnico é a oportunidade única que temos de apresentar nosso trabalho como altamente qualificado e, ao mesmo tempo, mostrar que somos uma autoridade tanto na teoria quanto na prática do assunto.

Com o trecho anterior em mente, seu primeiro trabalho deve ser de consultoria, portanto, faça muitas perguntas. Posso listar alguns exemplos úteis no momento do onboarding. Veja abaixo.

  • Você entende como funciona a tradução no mundo do marketing digital?
  • Para quais idiomas você quer traduzir, localizar ou transcriar seus conteúdos?
  • Qual país você tem em mente?
  • Qual é o objetivo que você quer alcançar com essa ação?
  • Quais conteúdos você quer traduzir, localizar ou transcriar?
  • O seu site já tem as configurações necessárias para ter conteúdos em mais de uma língua?
  • Que tipo de dados são apresentados nesses conteúdos?

Geralmente, a ideia de traduzir conteúdos se apresenta como uma forma simples de atingir novos públicos. No entanto, depois das perguntas anteriores, fica claro que são várias as respostas que precisamos responder para alcançar os resultados que queremos.

Além disso, é provável que seu cliente não saiba muita coisa sobre o assunto, então, seja paciente, didático e explique com calma a diferença dos conceitos que estamos tratando no artigo. Assuma o papel de autoridade.

Como trabalhar a tradução no marketing digital?

De forma simples, quando pensamos em converter uma mensagem de uma língua X para uma língua Y, tanto de forma escrita quanto falada, falamos em tradução de forma abrangente.

No entanto, dependendo do foco, podemos diferenciar três modalidades de tradução que têm características específicas que vão dar um norte para seu trabalho: tradução, localização e transcrição.

A seguir, vou definir cada uma delas, sempre pensando em termos de marketing digital e não em termos de tradutologia (ciência que estuda os processos de tradução):

  • tradução: a tradução é a atividade mais abrangente das três. O objetivo é passar a mensagem da língua X para a língua Y, de forma clara, mantendo o sentido do texto original e respeitando a tradição cultural do público-alvo;
  • localização: como o nome já mostra, é uma modalidade que trabalha os conteúdos de forma bem específica, pensando no público local. O foco é os aspectos mais relacionados aos dados e à usabilidade de produtos, tanto na interface física quanto na escrita. Em outras palavras, é uma tradução que vai muito além da atividade intertextual;
  • transcriação: esta modalidade também é conhecida como tradução criativa e é a mais recente das três. A transcriação tem um nexo forte com marketing e publicidade e, em resumo, é um texto traduzido de forma mais livre, que responde a objetivos específicos que precisam de um olhar mais marqueteiro que linguístico.

A tradução como um todo é uma atividade de viés altamente intelectual e quem trabalha na área deveria ser capaz de desenvolver um trabalho dessa natureza nas sombras, como Lawrence Venuti afirma. Isto é, o texto-base deve ser natural, tanto no aspecto léxico, na sintaxe, semântica e cultura para os leitores finais.

É por causa das características anteriores que um ótimo conhecimento técnico-linguístico da área e habilidades de redação avançadas são pontos básicos e transversais nas três modalidades.

Quando traduzir?

Se seguimos a definição acima, (em que a tradução é a atividade mais generalista das três) temos que pensar quais tipos de conteúdos e qual fase do funil de vendas podemos selecionar para uma potencial estratégia de marketing internacional.

O tipo de conteúdo que poderia ser traduzido são os artigos evergreen, principalmente conteúdos do topo do funil. Os motivos são a construção do texto e o objetivo dessa fase do funil.

Conteúdos evergreen são amplos e trazem informações gerais sobre um determinado assunto. Da mesma forma, a intenção deles no topo do funil é responder dúvidas comuns para um tema específico. Nessa perspectiva, a intenção de busca tende a ser mais homogênea.

Quer um exemplo? Pensemos na palavra-chave o que é marketing digital. O artigo que pode ser produzido vai tocar em assuntos que são objetivos dentro da disciplina do marketing para, depois, fazer a conexão com o mundo digital e, finalmente, passar para as especificidades da área.

Sendo assim, o assunto é abrangente, não apresenta dados de nenhum mercado específico e não tem outra intenção além da educativa. Portanto, um conteúdo dessa natureza poderia ser traduzido sem grandes problemas.

Quando localizar?

Falar para um público local e fazer com que esse mesmo grupo de pessoas se interesse por um texto a ponto de deixar seus dados em troca de algum material rico é uma preocupação vinda do marketing e que também deve ser trabalhada no processo de localização.

A localização do conteúdo, isto é, focar em aspectos relacionados a dados, CTAs e uso de elementos locais para que o texto seja mais próximo da persona é uma técnica recomendada para textos mais específicos.

Os textos do meio e fundo do funil precisam ter uma relevância maior, já que, dentro dos seus objetivos, a conversão por meio da apresentação de dados é uma das métricas mensuráveis.

Vou dar um exemplo claro para vocês: suponhamos que você está trabalhando para uma empresa brasileira que quer se expandir para o cenário hispano-americano, especificamente para o mercado mexicano. O blog post de entrada para esse mercado é um guia completo sobre o assunto X, contendo dados sobre o mercado brasileiro, com imagens de empresas do Brasil e um CTA, ao final, convidando o leitor a entrar em contato com os consultores.

Faz sentido manter as informações do mercado brasileiro se queremos atingir o mercado mexicano? Certamente não! Portanto, a fase de pesquisa de quem trabalha com localização vai além do que conhecemos como documentação na área de tradução e se aproxima mais da área de copywriting. 

Nesse exemplo específico, quem localiza o conteúdo deve pesquisar dados similares ao mercado mexicano que tenham o mesmo impacto nesse público e, ao mesmo tempo, procurar imagens que tenham um objetivo similar às originais.

Localizar é muito mais que traduzir, em consequência, textos de meio e fundo do funil são ótimos candidatos para essa modalidade.

Quando transcriar?

A transcriação é a mais polêmica: há quem defenda que o melhor profissional para essa tarefa é alguém que vem do mundo da tradução e também existem empresas que preferem que esses profissionais tenham background em copywriting.

Essa modalidade é necessária quando o choque entre culturas é grande ou quando a intenção de busca de uma mesma palavra-chave difere muito entre a economia da língua original e a economia da língua de destino.

No entanto, como isso acontece na prática? Suponhamos que você lidere um projeto de expansão de uma empresa brasileira de tecnologia no Japão e exista bastante conteúdo que pode ser aproveitado. Para isso, você precisa considerar alguns aspectos, como o sistema gramatical, forma de comunicação escrita, tom dos textos de marketing em japonês, aspectos visuais, psicologia de cores e soluções para desenvolver convites para posts de meio e fundo do funil, por exemplo. 

Você deve traduzir criativamente para que o texto seja relevante para esse público, portanto, é normal fazer as mudanças necessárias para atingir o objetivo que você procura com o artigo. Sendo assim, você pode transcriar conteúdos de topo, meio e fundo do funil.

Um exemplo clássico de transcrição é a música. O que deve prevalecer na obra final? A tradução da letra original em inglês ou o respeito à métrica da tradução em função da instrumentalização? Nesse caso, os elementos rítmicos são os que têm mais relevância, logo a letra deve se adaptar a eles, pois esses elementos são imutáveis, capazes de descaracterizar o produto artístico.

Para o marketing, isso funciona de forma similar: você tem que adaptar o texto e criar trechos quando for pertinente, desde que mantenha o objetivo do conteúdo original.

Preciso ter conhecimento em SEO?

A resposta é simples: sim. Independentemente da modalidade que você definir para seus conteúdos, não podemos esquecer que eles estão dentro do contexto do marketing digital. Portanto, todas as boas práticas de escrita para a web também são válidas aqui.

O motivo é o seguinte: os motores de busca, funcionam principalmente com os dados das regiões específicas que queremos atingir, nesse sentido, a língua falada pelo público é produto do anterior. Lembra que acima eu falei em economia? Então, a maturidade dos mercados vai influenciar no comportamento de consumo das pessoas, logo o efeito no motor de busca também é evidente.

Em consequência, uma palavra-chave que tem uma tradução direta entre uma língua e outra pode ter intenções de busca completamente diferentes. Portanto, é necessário fazer uma pesquisa de palavras-chave para que o conteúdo consiga alcançar um ótimo desempenho.

Em conclusão

Ficou claro que, antes de falar “sim, eu posso traduzir seus conteúdos” é necessário entender qual é a estratégia do cliente, quais tipos de conteúdo ele quer usar nesse planejamento e qual é o melhor caminho que você, como profissional da tradução, deve seguir para fazer a escolha mais eficiente.

Gostou de entender o que é tradução e como ela se relaciona ao marketing digital? Se quiser saber mais sobre o tema, tenho este ebook que pode ser útil! Acesse gratuitamente e baixe quantas vezes quiser.

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