Lições da transição da Adobe para SaaS

O que você faria se percebesse que a estratégia para salvar a empresa envolve aumentar os custos e reduzir os lucros por alguns anos? Mark Garrett, então CFO da Adobe, seguiu exatamente esse caminho quando propôs a mudança do modelo de negócios para o modelo de assinaturas atual.

Adobe Saas

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Seu crescimento está estagnado, os acionistas não estão muito satisfeitos, e você, depois de muito estudo e reuniões, chegou a uma decisão que precisa ser tomada. Informa seu CEO, que, após algum debate, aceita. Agora é hora de levar para o conselho. E, então, você, confiantemente, diz que a estratégia para salvar a empresa envolve aumentar os custos e reduzir os lucros por alguns anos. 

Parece loucura e é preciso muita confiança para dizer isso e apresentar um gráfico como esse querendo manter seu emprego. Mas, foi exatamente isso que Mark Garrett, então CFO da Adobe, fez quando propôs a mudança do modelo de negócios para o modelo de assinaturas pelo qual a conhecemos hoje.

A empresa, que reportou no primeiro trimestre de 2019 U$2,6 bi em receita e crescimento recorde em 2018 com mais de U$ 9 bi em receita, passou por um desafio que muitas empresas de tecnologia são receosas em atravessar: a transição para o modelo de assinatura, ou SaaS.

Esse desafio é conhecido por “engolir o peixe” ou “swallow the fish”, como citado no livro Technology as a Service, devido à aparência do gráfico proposto:

Para fazer a transição para a nuvem, é preciso um investimento inicial alto em infraestrutura, talento e tecnologia, mas, uma vez que a empresa adquiriu clientes o suficiente nesse modelo, os ganhos compostos sobrepõem os custos de manutenção e aquisição devido à maior escalabilidade do produto e base instalada de assinantes.

Por que mudar

O modelo de licença permanente estava mostrando sinais de instabilidade. A empresa havia estacionado no crescimento entre 2 a 3 milhões de licenças vendidas por ano, e a única estratégia de crescimento viável era de aumento do preço de venda, o que propicia a entrada de concorrentes que podem facilmente roubar clientes, mesmo que com produtos inferiores em alguns casos.

Se antes a Adobe vendia uma “caixinha” de Photoshop por U$699 e U$199 por um update, a barreira de entrada era maior, o que limitava sua penetração em outros mercados como educacional, profissionais independentes, e tantos outros. Hoje, você tem acesso ao pacote inicial do “Creative Cloud” — nome dado à suíte de aplicativos relacionados a design, fotografia e afins — por R$49 por mês! Foi uma grande sacada realizar que o potencial de mercado das suas soluções era muito maior e não se acomodar com o alto market share da época.

Portanto, a aposta que a Adobe fez foi tornar seu produto mais acessível, fazendo com o que o cliente pagasse mais na medida em que visse sentido em novas funcionalidades ou softwares complementares, enquanto a companhia mantém um fluxo de caixa mais previsível. Ou seja, apesar do baixo valor de mensalidade, o usuário possui vários eixos de expansão de acordo com seu uso e vira interesse maior da fornecedora tornar o produto realmente útil para o cliente.

A transição

A crise de 2008/09 abalou muita gente, e a Adobe não saiu ilesa. As ações e receita caíram consideravelmente — cerca de 20% — enquanto pares do mercado de tecnologia que possuíam maior valor alocado em produtos de recorrência tiveram uma vida levemente mais fácil.

Uma empresa do porte da Adobe não simplesmente muda seu modelo da noite para o dia, é claro. Apesar de hoje essa transição ser digna de aulas de MBA, não foi tão bem recebida pelo público. Na verdade, houve uma petição exigindo que ela não adotasse o modelo de assinaturas. 

O planejamento começou cedo, em 2008, para que em 2011 fosse lançado o modelo de assinatura junto com o de licença permanente. Ótimo, certo? Pois é, mas o resultado foi uma queda de 6% em suas ações. Porém, nada que não fosse esperado pela equipe da Adobe, que seguia firme com o plano de engolir o peixe.

Em maio de 2013, ela decidiu matar o antigo modelo. O anúncio foi feita em uma carta aberta ao público. Além disso, ela compartilhou novas métricas com os analistas: ARR (Annual Recurring Revenue), ARPU (Average Revenue per User) e várias outras métricas SaaS. Foram estabelecidos importantes milestones na jornada, como alcançar 4 milhões de assinantes até 2015. E, em dois anos e meio, a Adobe foi de 0 ao desejado alvo de 4 milhões de assinantes.

Acostumada a anunciar planos no máximo anuais em seus relatórios a investidores, a companhia percebeu que no mercado da recorrência o longo prazo era mais apreciado. E, em mais uma mudança de cultura, passou a pecar pelo excesso na comunicação sobre suas metas e projeções em até 2, 3 anos.

Mudanças e impacto

Não foi somente no lado financeiro que foi preciso se reinventar. Em praticamente todos os departamentos foi preciso avaliar como poderiam fazer diferente. Do ponto de vista de engenharia, por exemplo, se antes eles sofriam tentando fazer com que clientes atualizassem as versões de seus produtos — e essas atualizações levavam até 2 anos para serem feitas —, hoje esse prazo parece uma eternidade, dada a velocidade com que é possível entregar atualizações on the fly para o usuário.

Aplicativos móveis que se conectam à biblioteca do Creative Cloud e novos protocolos que permitissem que o usuário fizesse o download dos programas precisaram ser criados do zero. 

Em uma transição para SaaS, o serviço se torna um componente chave do sistema, como nunca tinha sido anteriormente. Não só para garantir que o sistema está acessível, funcional e ágil, mas também para oferecer suporte, gestão de crise e suporte a diferentes meios de pagamento. Diante dessas necessidades, times que antes operavam em silos distantes se aproximaram e se tornaram praticamente pares, como TI, marketing, produto e engenharia.

Além disso tudo, nunca é demais lembrar que, no mundo de assinaturas, o cliente está decidindo todo mês se continua com sua solução, e a Adobe não foi diferente. Ela não poderia mais vender um produto e daqui a 2 anos aparecer tentando vender a versão 2.5. Então, outro aprendizado importante: eduque seus vendedores (e caso possua, canais) sobre a mudança, estruture como vai funcionar a compensação deles e prepare o lado financeiro. Afinal, imagine que uma empresa como a Adobe estava acostumada a vender 3 milhões de licenças por ano, e agora teria de cobrar 4 milhões de indivíduos todo santo mês.

Desafios

Você está há 30 anos fazendo a mesma coisa e indo bem, seus produtos viraram marcas fortes em seu nicho e, mais do que isso, alguns deles se tornaram verbos — quem nunca “photoshopou” alguma imagem? Então, imagine como internamente foi recebida essa mudança.

A partir do momento em que a decisão foi tomada, a Adobe optou, tal qual com os analistas de Wall Street, pelo excesso de comunicação internamente. Estimulava o tema para ser debatido, criaram canais de comunicação direta com a gestão para esclarecimento e foi extremamente transparente com relação à situação atual, planos e objetivos. Assim como em outros casos, muitos disseram que eles estavam loucos e deixaram a empresa.

Além disso, do ponto de vista do cliente, foi necessário criar um plano para entregar valor para eles de uma forma constante, quase diária, pois antes essa preocupação não existia. Foi preciso adaptar o produto para que ele gerasse valor de maneiras diferentes e não simplesmente vender a mesma coisa só que de um jeito diferente.

Algo que foi percebido pela equipe da Adobe foi o fato de que sua ação estava sendo avaliada agora não mais por receita, mas em assinantes, ARR, bookings etc. E esses são dados com acordos de não divulgação (non-disclosure agreement), então foi preciso negociar com auditores essas métricas que eventualmente retornaram à receita.

Aprendizados

Lembre que a Adobe precisou comprar briga com simplesmente:

  • clientes;
  • investidores;
  • funcionários.

Ou seja, todos os envolvidos em manter a empresa. Ela era líder de mercado e não precisava fazer isso na época. O Creative Suíte, conjunto de software para criativos, representava ⅔ dos lucros da empresa. Portanto, não era um simples experimento, mas uma decisão make or break

Depois de 5 anos de planejamento, a companhia completou a transição, mas ainda foi só o começo. A Adobe ainda não havia recuperado a arrecadação que conseguia com licenças permanentes e precisou manter todos a bordo da mudança usando táticas que foram citadas acima, mas em resumo:

  • ao considerar transição para o modelo SaaS, estipule metas de longo prazo que ressaltem o ganho composto da distribuição de receita ao longo dos anos;
  • mantenha a transparência o tempo inteiro e peque pelo excesso de comunicação. É uma mudança grande e muita gente precisa ser educada sobre novas métricas e processos;
  • não subestime a importância de infraestrutura: financeiro, TI e customer service serão cruciais para que o cliente decida continuar com você no próximo mês!
  • não ache que simplesmente vender a mesma coisa cobrando diferente será suficiente.

Mas o que fica de lição, principalmente, é a coragem da Adobe de olhar para sua estratégia, seus produtos e mercado — um que ela liderava absolutamente — com um olhar crítico, saber qual era a decisão e tomá-la. Muitas empresas acabam esperando demais até que um concorrente chega com um modelo muito mais centrado no cliente e disruptivo para aquela indústria, e aí já pode ser tarde demais. Foi necessário perceber que o mercado estava indo para uma direção, e eles tinham uma escolha que era ir junto ou não. Mas evitar que ele avançasse nunca foi uma alternativa.

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