Nesse momento estou sentado no meu apartamento, em isolamento, pensando em como tudo mudou tão rapidamente em algumas semanas. Minha agenda de eventos, antes lotada, simplesmente foi toda cancelada, mais de 550 Rockers em home office obrigatório.
Incerteza é a palavra que me vem em mente, mas como otimista que sou, vou trabalhar dobrado para superar essa crise que pegou a todos. A única certeza que tenho é que o marketing mudará muito depois que isso tudo passar e, com isso em mente, resolvi perguntar para sete líderes reconhecidos do mercado:
“Como você acha que o Coronavírus vai impactar o ecossistema de marketing no Brasil, a curto e longo prazo?”.
Recebi, como esperado, ótimas respostas que acredito serem úteis para qualquer profissional de marketing hoje. Há uma percepção geral de que é necessário se preocupar muito em como sua marca é vista e é o momento de mostrar o que você está fazendo para apoiar os outros e estar mais presente para o público e seus clientes.
Além disso, as mídias tradicionais, principalmente mídias outdoor, sofrerão grande impacto negativo (afinal, menos e menos pessoas estão saindo de casa) e as mídias digitais terão que ser certeiras nas métricas. Se o Retorno Sobre Investimento (ROI) ainda não era uma preocupação, agora o profissional de marketing não tem mais escolha e deverá andar lado a lado com o departamento financeiro.
Um ponto positivo apontado é que o consumo de conteúdo online aumentará muito nesse momento, com muitas pessoas procurando maneiras de se entreter e se capacitar virtualmente. Isso pode ampliar a quantidade de pessoas que já está acostumada com o mundo digital e criar um hábito duradouro, o que é uma ótima oportunidade para empresas que já investem em conteúdo.
As respostas desses profissionais são variadas, mas todas nos fazem pensar.
Tahiana D’Egmont, CMO da Max Milhas
A crise causada pelo coronavírus vai intensificar a necessidade de rápida adaptação do marketing para acomodar os hábitos de consumo e entender ainda mais os clientes. Acredito que mais marcas vão se preocupar com a forma como são vistas, para além do marketing de performance, e olhar a jornada do cliente e interação com o produto de forma mais ampla, migrando mais ainda em direção ao Product-Led Growth.
A curto prazo vejo uma migração de recursos para canais e táticas que permitam maior segmentação com base em antecedência de compra e categorias de necessidades, além de uma preocupação ainda maior com CAC e ROAS de curto prazo em preterimento ao LTV.
No médio e longo prazos acredito que haverá um amadurecimento dos líderes de Marketing no país: aqueles que passarem por esse momento turbulento com sucesso chegarão com mais visão e preparo do outro lado.
Rafael Kiso, Fundador e CMO da mLabs
São muitos fatores que vão mudar a curto prazo. Acredito que os grandes anunciantes vão reduzir campanhas de varejo físico, porque não faz sentido anunciar para as pessoas saírem das suas casas. Em virtude disso, muitas das mídias tradicionais vão sofrer. A mídia out of home pode inclusive até quebrar se a pandemia e essa situação perdurar por muito tempo.
No que diz respeito aos negócios online, os produtos digitais com certeza vão sofrer menos e continuar vendendo, e em alguns casos até ter alta. Isso até os estoques acabarem, afinal, todo mundo depende de alguma maneira de fábricas e distribuição. As fábricas, por sua vez, devem reduzir por conta dessa recessão.
No relacionamento com o cliente, é uma oportunidade das marcas adotarem estratégias mais avançadas de marketing de relacionamento — lives, webinars, video calls. Isso também fala um pouco do posicionamento das empresas em termos de marketing: o que elas estão fazendo para prevenir que o coronavírus esteja presente nos seus produtos e serviços? Vai ser preciso criar conteúdos e explicar isso para o mercado.
Vale também pensar no tipo de auxílio que empresas darão. Já temos cases como o LinkedIn liberando cursos online gratuitos, o Uber dando apoio financeiro para os motoristas que estiverem infectados ou em casa, Burger King doando dinheiro para o SUS.
Pensando em longo prazo, com relação a preços, teremos uma queda em relação a produtos e serviços em virtude de duas forças: muita empresa vai deixar de faturar por um bom tempo e quando voltar a vender, provavelmente vai ter que abaixar o seu preço. Ainda nesse cenário, muitos negócios devem quebrar se esse período se estender.
Também a longo prazo, acredito que o mercado das startups vai ajudar bastante, já que, provavelmente, ele vai ficar entre os sobreviventes com benefícios. Isso vai deixar evidente que é importante se investir cada vez mais em tecnologia e estar perto do ecossistema das startups.
Gabi Gonçalo, Head of Marketing da Netshow.me
Olhando de forma geral, o marketing é impactado negativamente com os problemas de queda nas vendas de alguns serviços. Por outro lado, há tipos de negócios que não estão sabendo o que fazer com tantos leads qualificados chegando no pipeline.
As demandas fora de rotina só aumentam e exigem uma mudança de foco total em relação ao planejamento inicial para este semestre. Neste momento, é preciso saber ser flexível e muitas vezes deixar de lado o que foi planejado anteriormente. O lado bom da atual conjuntura, se é que podemos encarar desta forma, está nas novas parcerias que surgirão. Parcerias estas entre empresas que se complementam e mudam o cenário catastrófico de muitos.
Tenha uma palavra em mente: resiliência. Neste momento, é necessário sair fora da caixa e voltar suas atenções ainda mais para a inovação e a tecnologia. Ambos os conceitos impactarão positivamente muitas empresas.
Falando do ecossistema do marketing como um todo, teremos inúmeros aprendizados e inovações que surgirão pela atual necessidade. Tiraremos muitas lições e sairemos desta situação ainda mais evoluídos. E isso não podemos negar.
Vivemos dias difíceis e a crise é gravíssima. De forma geral, é necessário ser hábil e ter a sensibilidade de identificar possíveis oportunidades em meio a todo esse caos.
André Siqueira, Co-fundador da Resultados Digitais
Primeiro, tem um aspecto de gestão que vem do home office. Isso pode criar uma cultura mais natural de trabalho remoto e facilitar na atração de talentos. Boa parte das empresas acaba sendo muito fechada para essa possibilidade, acabam se limitando ao alocado e aí reclamam que falta gente.
Com as ferramentas de educação à distância e a falta de barreiras na educação, pode ter muita gente boa de diferentes lugares. Então essa mudança de cultura pode aumentar a capacidade executiva do time e subir um pouquinho de nível, subir um pouquinho a barra.
Outro aspecto de curto prazo é que as pessoas deixam de ter os eventos, os encontros sociais e isso se reflete em mais tempo pra elas. Boa parte desse tempo pode acabar indo para o digital. Quanto mais tempo, mais se investe em uso do Facebook, Instagram, leitura de blogs e as empresas têm mais possibilidade de alcançar essas pessoas.
Ao mesmo tempo, estamos em um momento que as pessoas têm pouco espaço na cabeça para outras coisas que não a saúde delas. É um contexto de muita novidade e vai ser difícil elas prestarem atenção em outros temas, mas isso tende a se assentar.
No longo prazo, além do home office que começa agora, mas pode ter implicações futuras, é a possibilidade de ter uma corrida, no segundo semestre, para compensar esse tempo parado. Tenho visto, por exemplo, muitos eventos que estavam marcados para o primeiro semestre indo para o segundo e isso deve gerar um overflow de informação muito grande. É provável que tudo fique um pouco mais saturado e seja mais difícil alcançar o público de evento, até porque a volta de encontros sociais diminui o tempo das pessoas.
Gabriel Costa, CMO da Singu
Quando penso na situação, acredito que há três grandes impactos. O primeiro é o desaquecimento do mercado e redução de vagas abertas: como essa crise vai impactar economicamente muitas empresas, todas vão repensar sua estratégia do ano, gastos, resultados prometidos e possíveis de ser alcançados, etc. Isso vai fazer com que naturalmente tenhamos menos vagas.
O segundo é que a educação em marketing digital tende a aumentar, principalmente por donos de pequenas empresas. Digo isso porque a maioria das pequenas empresas não vai ter dinheiro pra contratar alguém, mas ainda sim vai precisar crescer. Acredito que comece a ter bastante gente nova estudando o tema por necessidade.
O terceiro impacto, pelos fatores financeiros citados acima, mais do que nunca, é a demanda por soluções gratuitas de educação e ferramentas de marketing. Inbound marketing bem feito tende a gerar bastante resultado no médio prazo. Por isso, vejo uma grande oportunidade para infoprodutores ou empresas que já têm autoridade em conteúdo e ferramentas. Se focarem em distribuir conteúdo para essa persona, essas companhias podem se dar bem no médio prazo.
Há também duas questões-base que envolvem os profissionais de marketing. A grande maioria das empresas vai tomar uma pancada em seu setor financeiro. Isso vai obrigar a busca por canais alternativos, mais baratos e eficientes. Geralmente, são nesses momentos que a criatividade aflora e os melhores profissionais de marketing se destacam.
Quem trabalha com marketing também vai ter que olhar mais o negócio e não só seu silo. Como todas as empresas vão ficar mais responsáveis financeiramente, imagino que uma boa parte vai querer ver para onde está indo cada centavo e vai esperar o ROI. Então os profissionais de marketing vão poder se esconder cada vez menos atrás das métricas e precisarão entender o impacto real do seu trabalho no negócio.
Thais Bittencourt, Marketing Manager da Magnetis Investimentos
O primeiro ponto é que as empresas se viram forçadas a terem uma boa gestão de crise. Por mais que sejam marcas e instituições, os consumidores cobram posicionamento em momentos importantes como esse e é fundamental que as marcas sejam fonte confiável de informações.
Particularmente, noto cada vez mais a importância da construção de uma marca sólida, pensando em longo prazo. Marketing também é sobre relacionamento com o público e vejo essa necessidade sempre que somos colocados à prova em momentos mais delicados. O cliente que confia, permanece e indica para mais pessoas.
Por fim, precisamos ser criativos para explorar novos canais. O WhatsApp, por exemplo, é um ótimo espaço para repassarmos conteúdo valioso de uma forma muito simples e ágil. As empresas ainda o exploram pouco para gerar valor para a marca.
Maíra Gracini, Senior Marketing Director da Zendesk
Penso em 4 ações que são muito importantes pros executivos de marketing. A primeira é não medir esforços para apoiar as mudanças do atual cenário, seja seguindo orientações oficiais da OMS, seja criando formas seguras de trabalho para os colaboradores. Além disso, e não menos importante, deixar claro para os clientes sobre o que sua empresa está fazendo pra apoiá-los.
A segunda ação é preparar os times pra atuar nesse novo contexto. Precisamos se adaptar rápido a trabalhar no contexto do home office, de não estar fisicamente presentes como estávamos desde algumas semanas atrás.
O terceiro ponto é monitorar e antecipar qualquer mudança de comportamento de consumo dos clientes. O setor de vendas pode ser impactado, já temos um cenário de insegurança, então temos que nos antecipar e criar planos de contingência sobre esse contexto para agir rapidamente.
A quarta ação é uma revisão de planos de marketing pra ajudar nesse novo contexto. Então usar muito de plataformas digitais, criar formas de conexão que não são pessoais, se apoiar em conteúdo, em eventos e discussões virtuais. Nesse momento devemos fazer investimento pra apoiar a conexão entre empresa e cliente de forma digital.
Conclusão
Vivemos um momento complicado e há muitas incógnitas sobre o que nos aguarda no futuro, mas como disse Ghandi: “o futuro depende daquilo que fazemos no presente”. Hoje, teremos que ser flexíveis, resilientes, criativos, solícitos e pacientes.
Essas atitudes nos recompensarão com mais maturidade e experiência e aí é só seguir os sábios conselhos de Beth Carvalho:
“Levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima”.
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