Devo confessar e sem culpa: eu já usei muitas técnicas de otimização de títulos na vida e que geraram milhares de cliques, derrubando até sites grandes por excesso de tráfego algumas vezes (um troféu, assumo!).
Sou um dos pioneiros em mídias sociais no Brasil e, lá em 2009, descobri que os títulos sisudos do jornal impresso não serviam para a internet. As pessoas viam e ignoravam. Não davam engajamento. E fui buscar coisas novas.
Naquele ano, comecei uma das minhas maiores aventuras na vida, que foi implementar do zero a área de mídias sociais de um dos maiores jornais do Brasil, o Estadão. Na época, era só eu, o Twitter e um monte de gente no jornal centenário dizendo: “Por que estão pagando salário de editor para este menino do Twitter?”
Tinha vindo de uma experiência muito rica cobrindo, entre outras coisas, mídias sociais e comunicação digital como repórter do suplemento de tecnologia do jornal e me sentia desafiado, mas com coragem, pra desenvolver algo sem benchmark na época.
E testei, testei, testei de tudo até meu time se tornar o responsável por 50% do tráfego do jornal.
Por que me lembrei disso agora? Porque a Carta Capital publicou um artigo mostrando como um site de entretenimento, o TV Foco, alcançou mais audiência que Estadão e Folha no Brasil com uma equipe de oito pessoas, requentando notícias de outros sites e com títulos friamente calculados pra gerar muitos cliques no Google e nas redes sociais. Vamos analisar.
Título otimizado é diferente de clickbait
Usar técnicas de copywriting pra fisgar a atenção do leitor não é, por si só, desonesto e nem pode ser considerado clickbait – aquela técnica maliciosa de exagerar no título o que será de fato encontrado quando a pessoa clicar (em resumo, frustrar as expectativas do leitor).
Cada mídia tem uma característica e você precisa conseguir se comunicar bem com o público em cada uma delas. Uma capa de revista pode ter um título até enigmático se houver uma foto incrível que transmita o assunto a ser tratado, por exemplo.
Num jornal impresso, há uma hierarquia de informações na página. Você pode também usar uma foto incrível com um título não muito elaborado. Ou usar um título ainda menos completo se este conteúdo fizer parte de outro maior como, por exemplo, uma peça com uma análise da notícia.
Como há uma diagramação dos artigos, fica claro que faz parte do mesmo contexto.
Já em plataformas de internet, seja em Google, Twitter, LinkedIn, home page de portal, o que for, o título tem um peso maior. Em redes sociais, você ainda pode trabalhar mais a imagem de destaque que aparecerá no feed. No resultado de buscas do Google, em muitos casos, ela nem aparece. Só o título e a descrição. Se não for bom, ninguém clica.
Aí entram técnicas de copywriting, de usar palavras-chave pra fisgar o leitor. Não há problema algum. A questão: você pode fazer isso de forma honesta ou enganando o leitor. Uma é ética, a outra, não. E, no Google, teoricamente, a segunda deveria ser punida.
Mas, como veremos no caso do TV Foco, infelizmente, não é o que acontece sempre na prática.
O caso TV Foco
Segundo informa em seu site, o TV Foco é um site de celebridades que existe desde 2006. A página descobriu uma forma de bombar sua audiência: o clickbait sensacionalista. Para você ter uma ideia, entre as manchetes bizarras, por exemplo, uma unha quebrada de Pabllo Vittar virou “perda de parte do corpo”, como vemos no print a seguir.
Truques sujos como estes já trouxeram problemas ao site, como processos ao publicar uma foto da atriz Isis Valverde amamentando com o título: “Isis Valverde mostra os peitos em foto íntima e faz grande anúncio: ‘Hoje tem’”. Na época, o site se retratou após artistas saírem mostrando na internet as piores manchetes que o site publicou sobre eles:
NOSSO MOMENTO @MariliaMReal
— +a (@maisa) December 12, 2019
Finalmente, depois de dizerem que eu estava grávida, que eu sofria, que meu namorado tinha "virado gay", entre outras mentiras não só sobre mim, mas sobre vários outros artistas… https://t.co/zp9x5ljh7K
não houve reparação aqui @tvfoco @aarontura to aguardando… eu e o Brasil inteiro que foi lesado com o sensacionalismo de vocês… pic.twitter.com/EcoDosWgIv
— maria mendonça (@MariliaMReal) December 12, 2019
Após outra polêmica com Gugu Liberato, o site prometeu no ano passado que iria mudar. E mudou?
No último sábado, por exemplo, o título de um post sobre o narrador Galvão Bueno parabenizando a esposa por 21 anos de casados foi: “Galvão Bueno assume relacionamento íntimo após anos e deixa público perplexo: ‘Não esperava ser.’”
Na sexta-feira, a entrevista da atriz Bruna Marquezine para um podcast dizendo que, quando era mais nova, pensava em ser mãe aos 23 anos teve como título: “Bruna Marquezine, aos 26 anos, expõe primeira gravidez, faz anúncio e assume em confirmação: ‘Ser mãe.’”
Como consequência deste comportamento antiético, conforme relata a reportagem da Carta Capital, diversos editores de sites de notícias ficaram em choque (não é sensacionalismo, é o adjetivo que o jornalista usou mesmo) ao constatar que, em novembro do ano passado, o TV Foco teve nada menos do que 36 milhões visitantes, segundo o ComScore (a bússola da indústria de mídia) – mais do que os sites da Folha e do Estadão somados.
O dono do TV Foco, Aaron Tura, diz que não há nada de errado. Para ele, o que faz é “compreender as exigências (do algoritmo do Google), se adaptar e seguir se reinventando.” Segundo Tura, todos os outros sites poderiam obter o mesmo “sucesso” que ele se colocassem a “técnica” em prática.
Talvez, sim, mas abandonar a ética e o compromisso com o leitor não é exatamente uma receita para o sucesso, né?
No topo do Google
Já conversamos muito aqui no blog da Rock Content sobre o Core Web Vitals. Foram as últimas mudanças nos algoritmos do Google para privilegiar a experiência do usuário, banindo a simples otimização mecânica para mecanismos de busca.
Óbvio, eu não tenho acesso ao Google Analytics do TV Foco. Mas não seria surpresa se o índice de abandono de página logo após o clique fosse enorme. Por que? Porque a pessoa se sente enganada e sai.
Uma busca por “Bruna Marquezine” e “gravidez” no Google, por exemplo, traz na primeira página uma matéria de maio 2021 do TV Foco que diz no título: “Bruna Marquezine, após assumir namoro com Enzo Celulari, tem gravidez anunciada e declara: ‘Anjo de luz.’”
Claro que, ao clicar para ler, o leitor é direcionado para uma reportagem relatando que a atriz apenas negou qualquer vontade de gravidez após um vidente dizer que ela teria seu primeiro filho em 2021. Enganoso, né?
Não é de hoje que o Google vem cobrando qualidade de conteúdo de publishers a cada atualização de algoritmo. E advinhem? O tempo de visita é um dos sinais de relevância de um site para ranqueamento. Se o visitante entrar e sair, significa que o conteúdo é ruim.
E, mesmo assim, o TV Foco continua no topo.
Fora as notificações de notícias que o Google envia para Android, presente em nove entre dez celulares no Brasil.
À reportagem da Carta Capital, o Google desconversou, dizendo que o destaque ao conteúdo de baixa qualidade é “um problema complexo, por isso nosso trabalho nessa área foi e seguirá sendo contínuo. Estamos comprometidos em continuar trabalhando nele.”
Otimize o título, mas sem perder a ética
Agora, vamos lá, sobre o que aprendi nestes mais de 15 anos trabalhando com internet. Antes de tudo: entenda seu público. Você pode ter o maior copywriter do mundo no seu time. Mas, se a sua audiência gosta de rock, por exemplo, se você postar sobre samba, não vai funcionar.
Dito isso: cumpra o que promete! Trabalhe seu título o máximo que der. É das coisas mais importantes para levar ao sucesso ou não dos conteúdos na internet. Mas seja ético. Quando falamos em título, ele deve ser atraente o suficiente para que o leitor clique, mas não deve ser mentiroso: deve entregar exatamente o que fez a pessoa se interessar.
Por exemplo, no título deste blog post que você está lendo, eu usei algumas técnicas de otimização e vou desconstruí-las pra você entender a minha intenção.
A frase é: “Clickbait faz site de fofoca passar Estadão e Folha. Google precisa evoluir”, certo?
Comecei o título com a palavra “clickbait” à esquerda porque é a que vai chamar mais a atenção dos leitores. É exatamente este o sentido da leitura: da esquerda para a direita. Se você fisgar a pessoa logo no início, a chance de ela ir até o final e clicar é maior.
Quando o leitor já sabe qual é o tema, agora, ele quer saber a novidade (lembre-se, estamos falando em conteúdos noticiosos). Vamos analisar o restante do título.
Muita gente deve conhecer o TV Foco, mas, certamente, muito menos do que Estadão e Folha. Portanto, eu fiz uma escolha consciente: chamar o TV Foco de “site de fofocas” e usar os nomes dos jornais para as pessoas entenderem o quão grande é isso: um site de amenidades passando dois dos maiores sites de notícias do Brasil em audiência.
Ao mesmo tempo, eu quis instigar a sua curiosidade para descobrir sobre qual site estamos falando. Mas não sou João Kleber algum e entreguei logo no quarto parágrafo, certo?
Por último, eu sinalizei que existe uma polêmica e este é um artigo opinativo. Ao usar “Google precisa evoluir”, eu adianto ao leitor a problematização do que vamos tratar e instigo a vontade de clicar para ler. Com você funcionou: você está aqui, não está? E eu consegui te entregar tudo o que prometi, não consegui? Eis um “clickbait do bem.”
Mantenha honestidade com seu público
Não há nada de errado em usar técnicas de copywriting e storytelling. Elas funcionam, seja no jornalismo, seja no Marketing, seja até no cinema. Pode ver: a maioria dos filmes começa na calmaria, depois vem um desafio, a pessoa protagonista vence este desafio e, por fim, chegamos no “felizes para sempre”, que é a calmaria novamente.
O que é isso? A clássica Jornada do Herói, que pode ser usada em diversos tipos de storytelling.
Já que já usei metalinguagem antes neste texto, vou um pouco mais fundo agora. Fiz você clicar nele, certo? Depois, te trouxe até aqui. Como? Em vez de começar falando do TV Foco, eu fiz um storytelling meu no começo do texto pra te mostrar que eu tenho autoridade no assunto e já desmistifiquei logo de cara que otimizar o título não é algo errado.
Não foi um surto de criatividade minha. Usei exatamente a Jornada do Herói, como em vários outros textos meus. Você pode até se interessar pelo assunto, mas poderia não ter vontade de ler minha análise até o fim se eu não fosse “um dos pioneiros das mídias sociais no Brasil”.
É a minha carreira, faz parte do meu storytelling. Não se sinta manipulado, mas minha intenção sempre foi fazer você chegar até aqui e continuar até o fim. Estou quase conseguindo, né?
Como aprendi a fazer isso? Primeiro: escrever é, antes de tudo, ler. E eu leio compulsivamente desde os seis anos de idade (tudo: de literatura clássica a catálogos da Avon). Segundo: testando as táticas que você se inspira no que lê. Mas sempre sendo honesto com o público.
Por exemplo, quando estava no Estadão (também trabalhei por anos na Editora Abril como Head de Growth e implementei a mesma coisa), eu entendi que o veículo que escrevia as chamadas mais claras, didáticas, conversadas e em menor tempo conseguia melhor repercussão nas redes sociais.
Usava mais ou menos a estrutura que mostrei no título deste post – sempre me preocupando em não ter siglas só para entendidos. Mas ia além.
O que fiz? Um exemplo: em grandes acontecimentos, assim que chegava a notícia na redação, antes mesmo de publicarmos a reportagem, a gente divulgava nas nossas redes sociais até sem link. E, claro, sempre com a preocupação de garantir que, mesmo com pouco tempo, a informação fosse verídica e de qualidade.
E construí processos. Se houvesse qualquer dúvida, abortava. Melhor perder o “furo” do que publicar uma “barriga” (erro, no jargão jornalístico).
Ah, Rodrigo, mas isso não traz clique. Não traz, não. Mas traz compartilhamentos, seu post em primeiro nos trending topics, aumento de seguidores, a certeza do seu público que você terá sempre a notícia em primeira mão. E, o mais importante, um melhor seviço prestado a seu público (o foco principal).
Resultado: mais cliques nos próximos posts – inclusive no próximo em que você conta a história com mais detalhes.
Um dos recursos mais famosos em títulos da imprensa no Brasil foi criado por mim no Estadão. Além de publicar antes de Folha e O Globo, lá em 2010, eu comecei a usar a palavra “URGENTE:” antes de todo tuíte com notícia importante (lembre-se do sentido da leitura!).
Era o nosso “Plantão da Globo”. Levava a um senso de urgência e trazia mais compartilhamentos. Todos os veículos copiaram. Tudo bem. Faz parte de desenvolver as coisas.
Alguns tuítes históricos desta época:
Note que, além do “URGENTE:”, como fiz com “clickbait” no título deste blog post, colocamos o tema principal à esquerda, em destaque. É sobre aquilo que vai chamar mais a atenção e as pessoas vão ler antes para se interessarem depois pelo que aconteceu.
No caso, os temas principais são “Amy Winehouse”, “Oscar Niemeyer” e “Haddad e Alckmin” – os dois últimos estavam em evidência durante os mega protestos em junho de 2013. Com o tempo, ainda adicionamos um “mais informações em instantes” no fim para a galera saber que estávamos produzindo uma reportagem completa com todos os detalhes e soltaríamos logo.
Em algumas outras ocasições, em casos de morte, eu cheguei a usar “Morre” depois do “URGENTE:” como primeira palavra e o nome da pessoa depois. Funcionou. Mas confesso que foi meio que sem querer. A gente é humano e, mesmo sendo jornalistas, também nos chocamos e ficamos tristes.
Queremos informar, mas, claro, eu era fã da Amy e senti o baque ao saber da morte dela e já precisar postar algo em cinco minutos, por exemplo.
Foco na satisfação do leitor
Sou hoje Head de Conteúdo aqui na Rock Content, responsável pelo time de topo de funil do Marketing e por duas estratégias editoriais: a evergreen (SEO), com conteúdos para tirar dúvidas que as pessoas pesquisam no Google, e a de thought leadership, trazendo informações e análises sobre trendings em discussão para que profissionais de Marketing tomem as melhores decisões em suas estratégias.
É exatamente neste último caso, inclusive, que me encaixo neste blog post – e eu espero que você realmente tenha tido algum insight interessante até agora. Se não teve, vou dar umas dicas finais agora (olha um gancho pra te segurar preso no texto!).
A Rock Content tem nove anos de idade. Já tinha uma estratégia muito avançada antes de eu entrar aqui. Por que? Porque sempre se preocupou mais com a qualidade de seu conteúdo do que com o simples uso de técnicas.
Claro que conhecer e testar é importante, mas o mais importante é trazer satisfação pra quem te lê. É resolver a dúvida ou o problema. Não é sobre ter luzes verdes no Yoast, o plugin de SEO para WordPress, por exemplo.
Há nove anos, sim, a Rock Content também usa técnicas pra otimizar títulos de conteúdos, mas cumpre exatamente o que promete. Se for pesquisar o que é SEO ou Marketing Digital no Google, vai nos encontrar nas primeiras posições prometendo explicar tudinho.
E cumprimos com artigos completos de milhares de palavras! Por isso, estamos em primeiro lugar – não é por causa de clickbait. A pessoa acessa, gosta, compartilha, vira fã.
Audiência é consequência de um bom trabalho, não pode ser o foco. Temos hoje 7 milhões de visitantes mensais nos nossos blogs em Brasil, Estados Unidos e México – e é uma honra pra mim coordenar este time global incrível. Mas é um trabalho que vai além de técnicas para agradar algoritmos de buscadores ou redes sociais (como o dono do TV Foco declarou à Carta Capital). É sobre pessoas como você!
A Rock Content construiu e continua a construir sua autoridade pela qualidade no Brasil e pelo mundo afora. Se um dia, Google ou LinkedIn não existirem mais, continuaremos a ter pessoas que virão atrás da gente (é pra isso que trabalhamos tanto!). Mesma coisa com Estadão e Folha, que construíram suas credibilidades por mais de cem anos.
Espero que o Google avance e consiga filtrar melhor seus resultados por qualidade. Neste dia, você acha que o TV Foco vai sobreviver também? E seu site: você prefere pensar só no hoje ou construir algo que vá durar anos e anos?
Obrigado pela conversa. E por ter conseguido te trazer até o fim! Que tal se inscrever na nossa newsletter semanal, a The Beat, pra continuar o bate-papo e acompanhar semanalmente textos como este, hein? Prometo que cumpriremos com sua expectativa!
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